Nos próximos dias 6,7 e 8 de julho haverá eleição da nova diretoria da FENAJ - Federação Nacional dos Jornalistas. Duas chapas estão na disputa: Chapa 1: "Mais Fenaj em Defesa da Dignidade Profissional" e Chapa 2: "Uma Outra Fenaj é Possível".
"O Jornalista" fez as mesmas 11 perguntas para as duas chapas. Veja as respostas fornecidas pelo candidato a presidente da Chapa 2, de oposição: "Uma Outra Fenaj é Possível", Beto Almeida*.
1-"O Jornalista" - Qual é a prioridade número 1 da chapa?
R: O maior problema do jornalista brasileiro hoje é o desemprego, que caminha junto com a precarização do trabalho. Há um exército de desempregados diplomados, e as faculdades que se reproduzem irresponsavelmente com dinheiro público jogam mais 8 mil jornalistas no mercado a cada ano, o que agravará ainda mais o desemprego. No ano passado 17 mil jornalistas foram demitidos e o silêncio da Fenaj diante desta calamidade foi ensurdecedor. Nossa prioridade como oposição é o combate ao desemprego através da multiplicação das fontes de trabalho, via expansão da mídia pública, seja ela educativa, universitária, comunitária, legislativa, estatal, cooperativa, sindical etc, já que são os conglomerados da mídia privada os que estão demitindo, e isto é uma lógica do neoliberalismo. Enxugam as redações, impõem as jornadas exaustivas, as múltiplas funções, precarizam as relações de trabalho e ameaçam com os estagiários e com um exército de desempregados que tem diploma. O que mais tem expandido hoje em comunicação é o setor de mídia pública, gerando empregos, com as tvs e rádios legislativas, universitárias. Defendemos ainda que o poder público cumpra o direito do cidadão à informação através de políticas públicas para a massificação da leitura de jornal, cujas tiragens hoje caíram aos níveis de 1984. Há 50 por cento de ociosidade na indústria gráfica, há quase metade dos jornalistas desempregada e há um povo sem acesso à leitura de jornal/revista. Propomos políticas públicas para editar jornais, com distribuição gratuita, elevando a cota de leitura dos brasileiros - um dos povos que menos lê no mundo - e também elevando a cidadania. O mercado não resolve por si só estas questões, ele tende a excluir mais. A maioria dos brasileiros está fora do mercado da leitura. É uma irracionalidade formar jornalistas em massa para deixá-los com diploma e sem trabalho, e um povo sem ler!
2-"O Jornalista" - Jornalistas têm sido assassinados no Brasil Outros são ameaçados e alguns precisaram até deixar o País.Como enfrentar a questão e estabelecer uma rede de proteção aos jornalistas sob risco?
R: Tomemos a tragédia do Tim Lopes. Ele já havia sido ameaçado de morte, assim como a jornalista Cristina Guimarães, que trabalhou com ele na trágica matéria "A feira das drogas". Cristina alertou a Globo sobre as ameaças, se rebelou contra a pauta-setença de morte, e caiu na clandestinidade, porque está jurada de morte pelo narcotráfico. A Globo, seguindo a lógica do sensacionalismo, do vale-tudo pela audiência, mandou o Tim para o patíbulo, e até hoje a Globo deve informações à sociedade, como revela o livro de Mário Augusto Jakobskind , "Tim Lopes, o fantástico Ibope". A morte poderia ter sido evitada, aquela matéria só era essencial para os cálculos do jornalismo sensacionalista da Globo. Ainda mais que a sua identidade já havia sido revelada pelo vídeo no Jornal Nacional, quando foi receber um prêmio de jornalismo. Cristina está na clandestinidade, mas está viva. Tim está morto. O pior é que a Fenaj endossou o tempo inteiro a versão da Globo, que tentou tirar de si toda a responsabilidade. Ora, nem a polícia, nem o exército vão a mais a certas regiões do Rio. Como enviar um repórter que estava, sabidamente, ameaçado de morte pelo narcotráfico, a uma favela dominada pelo tráfico? Por que até hoje a Globo não revela à polícia a testemunha à qual diz ter dado proteção? Por que a Fenaj preferiu endossar a versão da Globo quando deve lutar para que jornalistas sejam protegidos, não expostos a riscos desnecessários?
Na verdade, não se conhecem ações da Fenaj para dar proteção aos jornalistas. Em abril foram mortos dois jornalistas no nordeste. Alguém ouviu a voz da Fenaj? Será que ela sabe que isto ocorreu? Quando eu era vice-presidente da Fenaj, na gestão Américo Antunes, e houve o Massacre de Eldorado dos Carajás, fomos até lá e tiramos a jornalista Marisa Romão de lá, com seus dois filhos, pois ela estava ameaçada por ter testemunhado as execuções dos sem-terra. Ela está viva! O Tim deveria ter sido enviado para lugar desconhecido, até para o exterior. Cristina Guimarães está viva, na clandestinidade, mas não contou com qualquer ajuda da Fenaj, apenas do Sindicato dos Jornalistas de Brasília. O Antônio Pimenta, o diretor do Estadão que matou a jornalista paulista, está numa boa, impune. A família e os amigos dela, sofrendo esta grave humilhação, além da saudade, da dor. O que mostra que Fenaj deve ter posições de rigorosa distância e de classe diante deste sistema de poder que é a mídia, e que convive e realimenta a impunidade.
3-"O Jornalista" - Qual deve ser a postura correta da FENAJ frente ao governo Lula?
R: A Fenaj deve cobrar do governo Lula coerência com o programa de campanha. O MEC, recentemente, em acordo com a ABERT, reduziu de 5 horas para 35 minutos semanais o tempo de programação educativa obrigatória em TV, o que é um absurdo como linha de política de governo, diante de uma televisão tão degradada. A Fenaj calou-se! Nós vamos lutar para convencer o governo a ampliar o tempo de programação educativa obrigatória em tv, porque aquilo ali não é um negócio qualquer, é uma concessão de serviço público e deve cumprir a Constituição, que preconiza as finalidades educativa, informativa e cultural da tv. Hoje, muitos estudantes pobres, que não podem pagar cursinho, têm em alguns raros canais de televisão, a única oportunidade de preparação para o vestibular. Esta programação educativa deveria ser ampliada, mas o que se amplia é a programa animalesca, embrutecedora, deseducativa.
Também vamos cobrar do Governo que pare de perseguir as rádios e tvs comunitárias, humilhando e ameaçando comunidades pobres com metralhadoras e ações policiais que apreendem os equipamentos. Mais lógico para um governo Lula é democratizar a lei que já existe, inclusive regulamentando também as tvs comunitárias de baixa-potência em sinal aberto, com permissão para que também transmitam em rede de tvs comunitárias. Hoje é proibido. A lei atual é um contra-senso com a tecnologia, mas principalmente, com a democracia.
Finalmente, cobraremos do governo Lula coerência com o programa de campanha para a área da comunicação - participei de sua elaboração - onde assumiu o compromisso com a expansão da mídia nas mãos do poder público, através da destinação de recursos para equipar e qualificar as tvs educativas, a própria Radiobrás, cujo sinal ainda não cobre todo o território nacional. Deve cessar esta lógica de destinar recursos públicos para os conglomerados privados, pois isto significa reforçar o oligopólio, manter tudo como está, e afronta a constituição, onde se proíbe o oligopólio. Por que as tvs públicas devem estar impedidas da teledramaturgia (reservadas às tvs privadas) ou da transmissão de futebol, que vai migrando para as tv-pagas, excluindo o povão?
4- "O Jornalista" - A FENAJ deve continuar defendendo a obrigatoriedade do diploma?
R: Sim. Defendemos a regulamentação. Mas, ter diploma não é ter emprego. Nem é ter boa formação, pois hoje surgem dezenas de faculdades de comunicação a cada ano, despejando profissionais num mercado que vai se reduzindo. Diante da pressão dos empresários para impor mais precarização do trabalho, arrocho salários e jornadas exaustivas, devemos reforçar a regulamentação e, sobretudo, fortalecer os sindicatos na luta por salários decentes, pagamento das horas-extras, contra a demissão imotivada. Hoje, jornalistas experientes, com salários razoáveis, são sumariamente demitidos para a contratação de 3 estagiários ou jornalistas em fase de treinamento ganhando quase nada.
5- "O Jornalista" - Como a FENAJ deve agir para fortalecer os sindicatos dos jornalistas?
R: Há muito a Fenaj deixou os sindicatos ao abandono. No passado elaborávamos propostas padrão de acordo coletivo, de forma a orientar os Estados em suas negociações locais. Estudos técnicos eram realizados com organismos como Dieese, Diap etc para igualmente dar um norte e unificar as campanhas nacionalmente. Hoje os patrões vão unificados à mesa do dissídio e um sindicato do Norte não sabe qual foi a vitória de outro do Sul. Bandeiras como piso salarial e data base unificada não existem mais. Nem mesmo a luta contra o desemprego e contra a precarização do contrato de trabalho está entre as prioridades sindicais da nossa Federação. A Fenaj adotou um modelo europeu que privilegia o do lobby junto aos governos, e, mesmo neste campo, ela se mostra incompetente. Por exemplo, até hoje o veto presidencial de FHC ao projeto de lei que transferiria a ela o poder de conceder registros profissionais não foi votado e não há qualquer movimento neste sentido. Vários sindicatos se transformaram apenas em departamento regional de venda de carterinha de jornalista. Não contamos nem mesmo com o Jornal do Jornalista que, circulando ininterruptamente há mais de 20 anos, orientava e mantinha de sobreaviso a base sindical, unificando-a nacionalmente. Até o MST já tem uma agência de notícias de rádio; a Fenaj nem jornal tem mais.
6-"O Jornalista" - Reforma Sindical: qual a posição da chapa?
R: A Fiesp e seus pares pretendem, através da Reforma Sindical, preparar o terreno para a Reforma Trabalhista. Aparentemente as duas coisas seriam distintas. Mas não é bem assim.
As mudanças no artigo 618 da CLT estão suspensas desde que Lula assumiu a Presidência. Foram aprovadas na Câmara Federal, em dezembro de 2001, e não chegaram a ser votadas no Senado. Isso não significa, porém, que o perigo tenha passado. Mas, o governo tem sustentado a prevalência do negociado sobre o legislado, ou seja, há uma linha de flexibilização.
Vejamos. Do jeito que está, a Reforma Sindical permite que, em última instância, os empresários e o governo interfiram na decisão de qual sindicato representa certo segmento, através de um organismo tripartite, o Conselho Nacional de Relações de Trabalho.
Esse poder enfraquece a resistência dos trabalhadores frente à retirada de direitos hoje reconhecidos na CLT.
Essa fórmula, aliás, já deu péssimos resultados na Europa. Lá, mesmo com toda a tradição de séculos de luta, os trabalhadores viram muitos dos seus direitos históricos virarem pó com a cumplicidade e omissão das grandes Centrais Sindicais.
Para nós, a pespectiva é pior do que na Europa, pois não temos garantias de representação no local de trabalho com estabilidade e direito de exercício do mandato, que é a única possibilidade de alguma unidade de representação na base. No texto do Fórum Nacional do Trabalho só se fala de representação e deixa para depois a definição de qual tipo de garantia se teria a respeito. Ou seja, não garante nada.
Outro problema: até hoje, ao vencer o prazo de qualquer acordo ou convenção coletiva, até que fosse assinada uma nova, as cláusulas seguiam válidas. É a chamada prática da "ultratividade". O acordo anterior ultrapassa o prazo, mesmo se já terminado, se não tiver acordo novo. FHC queria ultratividade zero: acabou o prazo definido na convenção, vai tudo para estaca zero e fica-se sem nada até novo acordo. Isso representaria uma forte perda de direitos. Não conseguiu. Dá para imaginar a força de pressão dos patrões para terminar uma greve de campanha salarial com o perigo de perder o prazo e perder todos os direitos estabelecidos em acordos anteriores? Na proposta do Fórum Nacional do Trabalho, define-se uma "ultratividade de 90 dias". É perigoso para os trabalhadores.
O papel da Fenaj é mobilizar arduamente os jornalistas para impedir que direitos consagrados pela CLT, em 1º de maio de 1943, sejam retirados.
7- "O Jornalista" - Qual a posição frente ao Conselho Federal e ao projeto de lei que propõe a criação da Ordem dos Jornalistas, em tramitação na Câmara Federal?
R:Em primeiro lugar temos que deixar claro que a chapa 2 irá cumprir todas as decisões de Congresso tomadas soberanamente pela categoria. Mas este tema deve ser respondido em duas etapas. A primeira se refere a uma análise do texto proposto pela Fenaj ao Ministério do Trabalho.
Este texto não é o mesmo que foi aprovado pelos jornalistas no último Congresso de Manaus. Afrontando o estatuto da Fenaj, a entidade convocou no final do ano passado, para Florianópolis, uma reunião do Conselho de Representantes. Nesta reunião, o Conselho alterou o texto de Manaus sem que os jornalistas voltassem a ser ouvidos, ou mesmo informados. A nova versão retirou do CFJ o poder de fiscalizar as irregularidades do exercício profissional. Ele tem apenas o poder de "supervisionar a fiscalização". Não fica claro quem irá fiscalizar. Será que a missão vai continuar com a DRT? Se for, nada mudará no cenário trabalhista dos jornalistas brasileiros. As jornadas continuarão sendo excessivas, a hora extra não será paga, o contrato será de pessoa jurídica ou frila fixo.
Outro problema do texto é que ele também retirou da versão de Manaus os itens considerados irregularidades e passiveis de punição, tais como como a presença de irregulares sem registro, a existência de produtos jornalísticos (jornais, revistas, textos, vídeos etc.) sem a mão de obra jornalística, etc. Ao contrário da OAB e de outros conselhos, nosso CFJ, pela versão proposta pela diretoria da Fenaj, também não dá poderes de fixar honorários profissionais, o que poderia atender aos que estão no mercado como frilas. O CFJ proposto pela Fenaj só tem poderes de punir jornalistas legalmente habilitados e que tenham cometido deslizes éticos. Contra os verdadeiros charlatões ele é impotente.
Outro ponto que a chapa 2 sugere que seja refletida desapaixonadamente pelos jornalistas brasileiros é a real utilidade de estruturas do porte de um CFJ para representar os direitos dos jornalistas. Para isso, é bom dar uma olhada na realidade nacional e na latino-americana. Entre nossos vizinhos existem os dois modelos de organização profissional. A realidade mostrou que onde a estrutura sindical é o carro chefe, como a Argentina e, mesmo o Brasil, a força é maior. Já em países como Equador, Colômbia a implantação dos Conselhos - lá se chamam Colégios - resultou na falência do modelo sindical e a atomização da organização dos jornalistas em pequenas associações ou grêmios por local de empresa. Isso retira a capacidade de luta da categoria e contribui para a própria falência dos sindicatos e da Fenaj. Na Venezuela, há o Conselho, e os jornalistas apóiam o golpe de direita.
Quando olhamos para o Brasil, podemos perceber que as categorias organizadas em Conselhos - advogados, arquitetos, farmacêuticos, engenheiros, economistas, profissionais de educação física e mesmo nossos colegas das Relações Públicas etc - praticamente não possuem sindicatos. Esses profissionais acabam sendo representados em seus locais de trabalho pelas categorias majoritárias. É esse o modelo que o jornalista deseja? Ele deseja perder a sua condição de categoria diferenciada, ser mais um entre os demais? O jornalista de um Banco quer ser disciplinado pelas regras dos bancários, o da metalúrgica, pelos metalúrgicos etc.? Bem, esta será a conseqüência de uma estrutura sindical fraca.
Além disso, ainda há a parte financeira: A poderosa OAB Nacional , que para se manter além das caras mensalidades dos advogados conta com verbas recolhidas nas taxas dos tribunais, é obrigada a sustentar as OAB"s regionais nos pequenos estados. Em Brasília, um advogado é obrigado a pagar mais de 400 reais apenas para ter o direito ao trabalho. Este valor é, em muitos estados, o salário de um mês do jornalista. Em 18 Estados isso equivale a 50% do piso. Com tantas taxas para pagar e tanto desemprego pra enfrentar, a tendência do jornalista será optar pela contribuição obrigatória do Conselho e ficar inadimplente com o sindicato, já que lá é opcional. A conseqüência será a falência da nossa estrutura sindical, inclusive da Fenaj. E sem sindicatos, não há dissídios, data-base. O conselho não pode fazer isso. Alguém já ouviu falar em campanha salarial de técnicos de educação física, de nutricionistas, ou mesmo de RPs? O piso salarial depende do acordo coletivo firmado pelo sindicato! O Conselho também não pode representar os jornalistas naquelas grandes ações, tipo plano Bresser, aumento de contribuição da previdência etc. Não poderá, nem mesmo, verificar se as verbas rescisórias de um jornalista na hora da demissão foram feitas corretamente pelo patrão. Sem sindicato ou com sindicatos fracos o resultado será um perfil salarial baixo, a inexistência de pisos e até mesmo a possibilidade de perda de acordos coletivos de trabalho.
A opção do passado - vetada por FHC - era inteligente, pois não matava a estrutura sindical dos jornalistas, pelo contrário a reforçava com poderes de Conselho. Acreditamos ser necessária uma avaliação do novo cenário político. É certo que a chapa 2 irá efetivamente encampar a decisão tomada pela categoria, mas somos fortemente contra a engodos como este texto de projeto de lei, alterado sem conhecimento da base, e que já está circulando nos corredores do poder.
8-"O Jornalista" - É uma boa idéia a criação de uma TV Pública Internacional anunciada pelo governo federal?
R: No mundo moderno, com o perigoso controle do fluxo de informações televisivas por alguns empresários associados à indústria bélica, o Murdoch, por exemplo, e o controle dos satélites por apenas 6 conglomerados, é importante que os estados periféricos tenham sua televisão e com alcance internacional, não apenas para os brasileiros que vivem no exterior, mas para um maior equilíbrio informativo. É claro que a programação desta tv deve estar em sintonia com a Constituição, sendo plural, diversificada, educativa, informativa e defensora da cultura nacional, o que já não ocorre com o audiovisual imposto ao povo brasileiro, desnacionalizado e de baixa qualidade. Cerca de 85 por cento do audiovisual no Brasil é produção norte-americana. Somos um povo ocupado em seu imaginário. Devemos postular um fluxo informativo-cultural mais equilibrado, sem imposições das nações mais poderosas. Uma TV Internacional deve responder ao desafio de formular uma política estratégica para o Brasil, a um projeto de nação, em sintonia, por exemplo, com as disposições constitucionais para a integração dos povos latino-americanos, Uma integração democrática, sem imposições. Mas, a sua criação remete para a questão de retomar o controle brasileiro sobre os satélites, já que desde a privatização da Embratel, agora de capitais mexicanos, possuímos mais esta vulnerabilidade externa. Mesmo nossas comunicações militares, em caso de intervenção externa na Amazônia, já não estão mais sob nosso controle estrito. Isto é grave. Na Guerra da Yugoslávia, a Otan determinou a retirada do sinal da tv yugoslava dos satélites europeus. A Chapa de oposição, contrariando o silêncio da Fenaj sobre o tema, se soma a personalidades, nacionalistas, intelectuais, em defesa da retomada do controle nacional sobre a Embratel, pois isto é estratégico. E também defendemos uma tecnologia brasileira para a tv digital, gerando empregos aqui e reduzindo a dependência externa, tecnológica e financeira. A Fenaj é omissa nisto também.
9- "O Jornalista" - Qual o posicionamento da chapa em relação ao Pró-Mídia, financiamento do BNDES ao setor de comunicação privada?
R: Somos contra o Pró-Mídia. Ao longo de sua existência os grupos de comunicação sempre receberam dinheiro público, sob variadas formas, favores creditícios, empréstimos não pagos, etc e agora provam sua ineficiência empresarial. Só se transformaram em poderosos conglomerados graças aos recursos públicos e à proteção para o controle do mercado. É hora de provar que acreditam em sua linha editorial onde demonizam a função do estado e endeusam o mercado! Para onde foram todos os recursos recebidos ao longo de décadas? Além disso, há uma resolução do TCU determinando ao BNDES que suspenda todo financiamento para a Globopar por considerar operação temerária com recursos públicos. E a Procuradoria da República já abriu inquérito administrativo para investigar possível dilapidação de recursos públicos nesta propalada operação de salvamento da grande mídia endividada. Por que não vendem patrimônio para saldar suas dívidas como o faz a maioria das empresas? Além disso, o prof Carlos Lessa, grande brasileiro, lembrou em audiência recente no Senado, que o BNDES realizou ao longo de 42 anos mais de 700 operações de financiamento para a indústria da cerveja, e, não obstante, houve sua transferência recentemente para capitais belgas. Ou seja, não há garantias de que a injeção de recursos públicos na mídia garanta o controle nacional. Além do que, estes recursos públicos estariam assegurando a continuidade de uma programação abjeta, desinformativa, anti-nacional. Quando se fala ingenuamente na fixação de contrapartidas, deve-se lembrar que estes empresários sequer cumprem a constituição, as leis trabalhistas, a seguridade social, o que é obrigatório a todos os brasileiros. A única alternativa admissível seria: transferência do controle acionário das empresas para o BNDES, transformando-as em empresas públicas, civilizando e democratizando sua programação. Caso contrário, será uma nova aplicação temerária e arriscada de recursos públicos que, como no caso da cerveja, podem também ir parar em mãos do capital externo. Por que não injetar recursos públicos no fortalecimento da mídia pública, na consolidação de um outro modelo de mídia, conforme prevê a Constituição que estabelece a complementaridade entre o público, o estatal e o privado. No Brasil, só o privado recebe recursos públicos em grande monta.
10- "O Jornalista" - Qual deve ser o papel da FENAJ frente à grave crise que atinge a profissão e o mercado de trabalho?
R: O mercado de trabalho está encolhendo. Os conglomerados privados de mídia estão demitindo. A Fenaj deve lutar pela multiplicação da tvs universitárias, comunitárias, pela mídia cooperativa. Hoje só a mídia pública tem gerado emprego( tvs e rádios legislativas), e através de concurso público. A Fenaj deve posicionar-se claramente pela ampliação deste mercado de trabalho, que também é um fator de democratização, já que esta mídia não produz a baixaria. Nós defendemos a abertura do sinal das TVs Senado e Câmara e de todas as tvs legislativas, enquanto a atual direção da Fenaj e a chapa da continuidade defende o sistema de tv-paga, o que é de fato uma bi-tributação sobre o contribuinte, que já paga pela existência destas emissoras.
Mas, a expansão do mercado de trabalho não pode se dar sem a revisão das políticas públicas, para todas as áreas. A Fenaj deve recolher o clamor da sociedade contra a degradação da mídia e propor este outro modelo, que gera informação democrática e emprego. Para tanto, é preciso defender maiores investimentos no setor público de comunicação e isto é contra a lógica do FMI. Mas, a sociedade entenderá e vai apoiar, pois votou no Lula para isto mesmo. Defendemos a criação de um Fundo de Apoio à Radiodifusão Comunitária, baseado em percentual do faturamento publicitário, em especial da publicidade oficial. Já existe em outros países. Isto gera emprego, gera informação plural, regionalizada, pois com o barateamento relativo dos equipamentos é possível criar uma rede de tvs e rádios comunitárias espalhada em todo o território nacional. Será fator de integração - num momento em que as grandes potências ameaçam países de grande patrimônio natural - será fator de democratização da informação, de elevação cultural, de cidadania e consolidação de uma nacionalidade que se tenta desagregar.
Devemos responder com propostas de mais regulamentação às investidas do neoliberalismo que vai informalizando o mercado de trabalho. A cada rádio, pelo menos 2 jornalistas, pois rádio é concessão pública e não pode ser apenas caixinha de música e comitê eleitoral para o coronelismo eletrônico.
11- "O Jornalista" - Por que os jornalistas devem votar nas próximas eleições na sua chapa e não na outra?
R: A chapa 1 preconiza o continuísmo de uma gestão apagada, que colocou a Fenaj no ostracismo, uma entidade calada diante da degradação informativo-cultural, e que solidarizou-se com investidas anti-nacionais e elitistas de empresários, como a tv-paga, uma tv para poucos, mas sustentada com recursos públicos, uma verdadeiro apartheid audiovisual, responsável em grande medida pelo endividamento das empresas que defendem o desmonte do estado. A chapa de oposição quer uma revolução de prioridades na Fenaj, concentrando-se na multiplicação de fontes de trabalho, através da expansão da mídia pública, em particular a interiorana, para gerar emprego, informação diversificada, regionalizada. Quer fortalecer o sindicalismo de luta. A direção atual da Fenaj, que pretende continuar, tem uma perigosa proximidade com teses defendidas pela Globo, como se verificou nos episódios da tv-paga e na tragédia Tim Lopes. Não pode haver dignidade profissional com o desemprego de quase metade dos jornalistas. Temos outra linha, pois "Uma outra Fenaj é possível".
*Beto Almeida é âncora na TV Senado(ingressou por concurso público) onde, além de conduzir entrevistas e debates, apresenta programas culturais como o "Memória Brasileira" e o "Espaço Cultural". Foi vice-presidente da Fenaj. Colaborador militante da mídia alternativa, é o presidente da TV Comunitária de Brasília, fundada há 8 anos, onde dirige o programa "Contracorrente". Integra o Conselho Editorial do jornal Brasil de Fato, sendo ainda colaborador da revista Caros Amigos e do Jornal Pátria Latina. Desde a década de 80 coordena o Comitê Brasiliense de Solidariedade ao Timor Leste. Foi vice-presidente da Federação Internacional de Jornalismo entre 95 e 98, entidade com sede em Bruxelas e que representa jornalistas de mais de 100 países.
É membro da Comissão de Justiça e Paz, órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e ministra cursos sobre comunicação para entidades do movimento social. Graduou-se em Jornalismo na Universidade de Brasília (UnB), onde também durante um ano deu aula de Comunicação Comparada.
Mineiro de Campo Belo, 28 anos de profissão, Beto Almeida é diretor do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal. Passou pelo Jornal de Brasília, Correio Braziliense, Última Hora, Diário Popular, Estado de Minas, O Globo e Radiobrás, onde editou e apresentou o programa "Nacional Economia", da Rádio Nacional, em rede com 500 emissoras, e editava o boletim "o Dia a Dia da Economia", no Jornal Nacional da emissora. Foi comentarista sobre mídia e política na Rádio Cultura de Brasília, durante 4 anos, sendo afastado pela administração Roriz.